É indiscutível que nos últimos anos houve uma nítida diminuição do uso do famoso cateter de Swan-Ganz, sobretudo com o desenvolvimento de outras ferramentos para monitorização hemodinâmica em tempo real. No entanto, esta ferramente ainda tem espaço na avaliação das pressões intra-cardíacas, em casos selecionados. Com esse post, buscamos trazer, de forma simples, o passo a passo para a correta aferição dessas variáveis. Ao final, trazemos um caso real onde o uso das variáveis fornecidas pelo cateter mudaram a conduta clínica.
Uma vez o cateter posicionado adequadamente deveremos seguir uma sequência de passos para obter as variáveis desejadas.
- Anotar os parâmetros:
- Dose das drogas vasoativas (em mcg/kg/min)
- Registre se há assistência ventricular conectada ao paciente. Por exemplo, presença de balão intra-aórtico em atuação 1:1
- Frequência cardíaca, pressão arterial sistêmica sistólica, diastólica e média através de PA invasiva.
- Anotar o valor da pressão venosa central (PVC)
- Anotar outros parâmetros auxiliares: Hb/Ht, saturação venosa central, lactato, (..)
- Deixe o paciente em decúbito zero.
- Coloque o dômus do medidor pressórico no mesmo nível do átrio esquerdo, utilizando como referência a linha axilar do paciente.
- ‘Zerar o sistema’. Para isso, ‘feche’ a via do dômus do Swan-Ganz e da PVC para o doente e abra a via para contato com a atmosfera. Após isso, dirija-se ao monitor do paciente e selecione a tecla ‘zerar sistema’ (ou algo com nomenclatura semelhante a esta em seu aparelho). Observe nas curvas pressóricos do monitor se, de fato, isso ocorre, ou seja, as linhas ficam retilíneas e o valor vai a zero. Após isso, feche o sistema para atmosfera e retorne ac onexão entre o cateter e o paciente.
- Anotar os valores de pressão artéria pulmonar média (PAPm)
- Realizar o encunhamento da artéria pulmonar, para se conseguir estimar a pressão capilar pulmonar média (pressão de encunhamento). Lembre-se de deixar o balão insuflado por alguns segundos até que se obtenha uma curva estável de pressão. A medida da pressão capilar pulmonar deve ocorrer durante a expiração do doente.
Após realizar esses procedimentos, utilize os valores achados para realizar o cálculo das resistências pulmonares e sistêmica. Esses dados podem ser colocados em espaço próprio de alguns monitores cardíacos ou calculados manualmente de forma simples através das fórmulas abaixo:
Resistência Vascular Sistêmica (RVS) = PAM – PVC / Débito Cardíaco = valor em Woods -> se multiplicarmos por 80 = valor em Dynas
Resistência Vascular Pulmonar (RVP)= PAPm – PCPm / Débito Cardíaco = valor em Woods -> se multiplicarmos por 80 = valor em Dynas
Onde: PAM = Pressão arterial média / PVC = Pressão de venosa central / PAPm = Pressão média de artéria pulmonar / PCPm = Pressão média do capilar pulmonar ( também conhecida como pressão de encunhamento).
1 Dyna = 80 Woods
Veja na tabela abaixo os valores médios e sua faixa de normalidade.
Na prática (..)
Vamos tomar como exemplo uma paciente com insuficiência cardíaca onde foi passado o cateter de Swan-Ganz para auxílio no manejo de estratégia medicamentosa.
A paciente estava recebendo NO por relato de ‘hipertensão pulmonar’ com possível componente primário, ou seja, não secundário a disfunção ventricular, mas sim por patologia vascular pulmonar. Será que esse NO realmente tinha espaço na terapêutica da doente?
Os dados hemodinâmicos eram:
FC: 112 bpm
PA invasiva: 105 x 61 ( 76 ) mmHg
PVC: 25 mmHg
Débito Cardíaco (estimado por monitor Vigilance II): 3,5 L/min
Pressão de artéria pulmonar (PAP): 67 x 31 (42) mmHg
Pressão do capilar pulmonar (PCP): 43 x 28 (33) mmHg
Ora:
RVS = 76 – 25 / 3,5 = 14,5 W , que, multiplicado por 80 = 1,165 dynas
RVP = 42 – 33/ 3,5 = 2,57 W, que, multiplicado por 80 = 205 dynas (discretamente aumentada)
A luz do contexto clínico da doente como interpretar esses dados?
O gradiente transpulmonar é obtido pela diferença entre a PAPm (42) menos a PCPm (33) e seu valor é normal até por volta de 12-15 mmHg. Nesse caso, observamos o valor de 9. Isso nos mostra, portanto, que a causa do aumento da PAPm, que é considerada anormal quando acima de 25, resulta de aumento secundário a disfunção ventricular esquerda e não por quadro intrínseco de vasculopatia pulmonar.
Que condutas podemos tomar baseado nessa informação?
A primeira é a de se suspender o óxido nítrico, uma vez que não há benefício dessa medicação no contexto de HP secundária a disfunção ventricular esquerda. Além disso, esses dados nos mostram que a paciente, se houver indicação clínica, poderá ser incluída em fila de transplante cardíaco, uma vez que resolvida a disfunção ventricular, os valores de PAP tendem a normalizar após-TX cardíaco