Imagens em Cardiologia

Imagens em Cardiologia – infecção de esternotomia

 F.O. do paciente. O lado cranial é o lado esquerdo e a direita encontra-se a região mais caudal. Foto: arquivo pessoal do autor
A foto acima ilustra uma intercorrência infecciosa após uma esternotomia utilizada para uma cirurgia da revascularização miocárdica (RVM). Infecções de esternotomia, apesar da baixa frequência, são complicações que podem ser de difícil manejo e causam certa frustração na equipe médico e, sobretudo, no paciente.
Este paciente de 46 anos havia submetido há RVM há 12 dias. Retornou ao Pronto-Socorro do hospital onde havia sido operado por quadro de ‘vazamento’ de pus + vermelhidão na topografia da ferida operatória.
Deu entrada com uma toalha envolvendo a ferida, que estava suja de líquido de aspecto purulento e apresentando febre de 38,1ºC, com relato de dor no local da cirurgia e 2 episódios referidos de calafrio. Apesar dos sinais sistêmicos, não apresentava acometimento hemodinâmico.
Na exposição da F.O. observava-se área de hiperemia nos bordos da ferida e deiscência da sutura em sua região mais cranial com saída de discreta quantidade de líquido purulento. Observe, na região mais profunda, o fio metálico da rafia do esterno. A palpação, havia amolecimento de osso em esterno, mas sem ‘clique’ esternal.
Ao nos depararmos com uma situação com essa temos de colher do paciente algumas informações:

1) Quanto tempo da cirurgia ?
2) Quanto tempo da alta hospitalar ?
3) Houve algum complicação infecciosa durante sua internação ?
4) Quais os antibióticos que fez uso e qual último dia de aplicação ?
5) Quais co-morbidades do doente ?
6) A palpação: há amolecimento e/ou instabilidade do esterno?
7) Há sinais de acometimento sistêmico e alterações na hemodinâmica do doente ?

Usando essas informações podemos definir 3 cenários clínicos:

1) Infecção apenas limitada a ferida operatória
2) Sinais sistêmicos, mas sem sepse
3) Sepse grave ou presença de choque séptico

Em relação aos tipos possíveis de infecção temos:

1) Limitada a tecido superficial – pele, subcutâneo e músculo: o esterno é estável a palpação. Contudo, na presença de sinais sistêmicos, como febre e calafrios, associados a drenagem importante de secreção, mesmo com esterno estável, deve-se suspeita de infecção profunda.

2) Infecção profunda ou Mediastinite: essa situação pode partir de uma infecção de tecido superficial penetrando área mediastinal ou resquício de contaminação intraoperatória. Paciente apresenta-se com sinais sistêmicos infecciosos, podendo, ou não, ter infecção superficial adjacente. É um quadro grave, com mortalidade alta que requer pronta intervenção.

3) Deiscência de esterno: trata-se da separação das bordas do esterno, podendo ocorrer independente de infecção superficial. Paciente queixa-se dor esternal e pode ter a sensação de ‘clique’. No exame físico, coloca-se a mão, exercendo leve pressão, em cada hemitórax e pede-se para o paciente tossir, isso irá causar um barulho característico da movimentação de uma aresta esternal em contato com a outra, chamada de ‘clique’. Essa situação é uma emergência cirúrgica, pois há risco iminente de perfuração ventricular por algum fio de aço ou mesmo por resquícios ósseos esternais.

Alguns autores preferem abordar as infecções de esternotomia usando a classificação de Pairolero, que divide a infecção baseada no tempo de surgimento e seus aspectos clínicos, apresentada abaixo:

Tipo 1:surge geralmente na primeira semana após o procedimento formando secreção sero-sanguinolenta, mas sem celulite ou outros sinais de complicação associadas. Geralmente manejadas com antibióticos via oral e, eventualmente, alguma abordagem cirurgia.

Tipo 2: tipo mais prevalente, ocorrendo na 2-4 semana de P.O. podendo ter a presença de secreção purulenta, celulite, mediastinite, quadro de osteomielite e, mais raramento, costocondrite. Tratamento, além de antibioticoterapia, envolve debridamento de todo tecido necrótico e cartilagem envolvida. Drenos de sucção e uso de musculatura para peitoral também são opções.

Tipo 3: ocorre tardiamente, meses a anos, após o procedimento. Raramente com mediastinite presente, mas áreas de celulite localizada, osteomielite, costocondrite e presença de corpo estranho são frequentes. Necessitam de debridamento ativo e repetido. Após esterelização do tecido, técnicas de sucção e enxerto musculares são opções.

Classificação de Pairolero – Disponível para acesso aqui

De rotina deve-se coletar material da ferida operatória para cultura, coleta de 2 pares de hemocultura, exames gerais de bioquímica, PCR e hemograma e realizamos TC de Tórax com contraste.

A TC Tórax tem por objetivo detectar alterações em tecido operatório mais profundo. A presença de separação esternal, má fixação, erosão óssea,  pseudo-artrose que podem sugerir deiscência. A simples presença de coleção retroesternal, principalmente quando em pós-operatório recente é inespecífica e na maioria das vezes não tem significado patológico.

Em nosso serviço, após avaliação inicial do cardiologia clíncia, tanto a cirurgia cardíaca quando o serviço de cirurgia plástica são convocados para definir sobre a necessidade de procedimentos cirúrgico associado.

De maneira geral as feridas superficiais são manejadas com antimicrobianos associado a cuidados de locais da F.O e evoluem bem em longo prazo, a mediastinite requer antimicrobiano endovenoso associado a debridamento cirúrgico agressivo e a deiscência de esterno é de tratamento cirúrgico

Leitura sugerida:

Overview and Management of Sternal Wound
Infection. SEMINARS IN PLASTIC SURGERY/VOLUME 25, NUMBER 1 2011. Disponível aqui

Surgical management of sternal wound complications. Acessado em Set/2015 em uptodate/online Disponível aqui

Treatment of sternal wound infections after
open-heart surgery. Asian Journal of Surgery (2014) 37, 24e29. Disponível aqui

Pailorelo e cols. Long-term results os pectoralis major muscle transposition for infected sternotomy wounds Disponível aqui

Sobre o Autor

Daniel Valente

Médico com residência médica em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e em Cardiologia Clínica pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor-HC-FMUSP). Especialista em Ecocardiografia pelo InCor-HC-FMUSP e pelo Departamento de Imagem Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia (DIC-SBC). Doutor em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Coordenador do Serviço de Ecocardiografia da ONE Laudos.

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