Cardiologia Geral

Toda angina de início recente é INSTÁVEL ?

Uma dúvida muito comum aos clínicos e aos médicos de pronto-socorro é como diferenciar uma angina instável da estável. Por conta disso, acaba-se tratando de maneira invasiva – e desnecessária – muitos quadros de angina estável apenas se baseando no ‘tempo de surgimento da queixa’.

Saber diferenciar estas duas entidades clínicas através de uma anamnese detalhada é fundamental pois cada diagnóstico implica em tratamentos e estratificação de risco distintos, bem como necessidade a tomada de decisão entre o manejo inicial desse doente: via internação hospitalar ou não.  Veja mais sobre o assunto aqui

A definição teórica de angina instável é: isquemia miocárdica ao repouso ou ao mínimo esforço na ausência de necrose miocárdica (marcadores de necrose miocárdica negativos).
Aquele paciente que se queixa de uma dor precordial típica iniciada a 2 horas e ao REPOUSO não existe dúvida que seu manejo deve ser de acordo com os guidelines de Síndrome Coronariana Aguda ( que inclui: Infarto Agudo do miocárdio com ou sem supradesnivelamento do segmento ST e Angina instável) – mesmo que os marcadores de necrose miocárdica sejam negativos!
Contudo, dúvida impera em um paciente atendido em uma consulta ambulatorial ‘encaixada’ pela preocupação do paciente, que nunca havia tido dor torácica e que se queixa de uma dor torácica típica durante jogo de futebol 2 semanas atrás. Nega recorrência da dor após este episódio, tem trabalhado sem recorrência dos sintomas, embora não tenha jogado futebol novamente. 
O que fazer ? Encaminhar ao pronto-socorro por quadro de ‘Angina Instável de início recente’ ? Manejar como Angina Estável ? Essa distinção é fundamental, haja vista que, a depender da sua interpretação clínica, esse paciente pode ser encaminhado ao PS e terminar no laboratório de cateterismo ou – como nosso chefe Dr Eduardo Lima –  ganhar um ”#DAC” e iniciar o tratamento clínico para doença arterial coronariana com retorno ambulatorial precoce. 
Para isso, devemos ter em mente que em tudo na vida há um começo e com a entidade ‘angina estável’ não haveria de ser diferente. 
A Angina instável inclui 4 definições:
1) Angina ao repouso e prolongada ( > 20 minutos)
2) Angina de início recente que atinge classe funcional CCS 2-3 
3) Piora do padrão de angina prévia que atinge pelo menos classe funcional CCS 3 em 4 semanas
4) Angina após Infarto Agudo do Miocárdio (entre 48-72h) 
Portanto para saber diferenciar uma angina instável da estável oclínico deve ter em mente a Classificação da Sociedade Canadense para graduação da angina:
Portanto, voltando ao caso ilustrado, nosso paciente teria uma classificação de CCS 1, encaixando-se na definição de Angina Estável e deve ser manejado como tal, a despeito de início de sintomas há apenas ‘ 2 semanas’.
Veja mais sobre o manejo da Angina Estável aqui.
R.I.P Angina Instável ?
Vale ressaltar que diante dos novos ‘kits’ de troponina ultrassensível o diagnósticos de Angina Instável tem decaído progressivamente, ‘roubados’ pelo diagnóstico de Infarto Agudo do Miocárdico sem supra de ST. Em um futuro próximo, é possível que hajam mudanças no diagnóstico de angina instável e até mesmo que essa entidade clínica ‘suma’ do nosso rol de diagnósticos de Síndrome Coronariana Aguda. Em um artigo recente, publicado na revista Circulation em 2013, de autoria do Prof. Braunwald ele até mesmo questiona: “seria o momento de prepararmos o funeral da angina instável ?”


Mensagem final


– Não se deve usar apenas o tempo de início para distinguir Angina Estável da Instável. Lembre-se: toda Angina Estável teve o seu ‘D zero’ um dia.
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Sobre o Autor

Caio de Assis Moura Tavares

Graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo. Médico com residência médica em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e em Cardiologia Clínica pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor-HC-FMUSP). Atualmente é médico assistente do Departamento de Cardiogeriatria do InCor-HC-FMUSP.

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