Uma vez optado por se realizar uma Cardioversão (CV), química ou elétrica, para tentar restaurar o ritmo sinusal em paciente portador de Fibrilação Atrial (FA) a preocupação em relação ao desenvolvimento de episódios de tromboembolismo é grande.
De maneira clássica, em pacientes ambulatoriais, utiliza-se a anticoagulação com Varfarina e, uma vez que o paciente tenha 3 valores semanais consecutivos de INR na faixa adequada entre 2-3, procede-se a cardioversão. Mesmo assim, o risco de evento tromboembólico não é totalmente abolido, ficando em uma taxa de 0,5-1%, sobretudo nas primeiras 2 semanas após o procedimento.
A pergunta a ser respondida é: os Anticoagulantes Orais Diretos ( antigamente chamados de Novos Anticoagulantes – NOACs) também seriam efetivos na prevenção de eventos tromboembólicos após CV.
O grande interesse em avaliar isso é pelo fato de que esses fármacos, por sua maior estabilidade, conseguem manter um nível de anticoagulação adequado sem necessidade de se monitorar nenhum exame e, assim, o tempo necessário para se realizar a cardioversão seria mais previsível, haja vista que atingir as 3 semanas de TP na faixa em alguns pacientes pode ser demorado e, assim, a cardioversão acaba sendo prorrogada por mais tempo do que o planejado ( média de 3 meses!)
Na tentativa de se responder essa questão o estudo ‘Is one month treatment with dabigatran before
cardioversion of atrial fibrillation sufficient to prevent thromboembolism?’ foi elaborado.
Trata-se de estudo sueco publicado na Europace em 2015, onde cidadãos suecos com FA ou Flutter> 48 h que utilizando dabigatrana antes e após a cardioversão, entre 2012-2014, foram analisados e os seus dados comparados a uma população controle, entre 2012-2013, que fez o mesmo procedimento na vigência de Varfarina, até então a terapia padrão.
Foram alocados 631 pacientes. dos quais 61 já estavam em uso do dabigatrana, enquanto os outros eram virgens de tratamento.
No grupo da Varfarina, foram avaliados 166 doentes.
As características desses doentes encontram-se abaixo:
No grupo de pacientes virgens de tratamento ( 570 doentes ), foram feitas 705 cardioversões (CV), uma vez que 121 deles foram submetidos a mais de um procedimento. Noventa e um por centro desses doentes tiveram sucesso em se atingir o ritmo sinusal.
A média de tempo entre o início da dabigatrana e a CV foi de 32 ± 15,3 dias. No grupo da Varfarina, a média foi de 74 dias.
Ecocardiograma Transesofágico foi feito raramente nesses doentes ( não foi fornecida o número exato de pacientes!)
A incidência de eventos tromboembólicos em 30 dias foi de apenas de 3 pacientes, ou seja, 0,51% ( considerando todos os doentes). Se considerarmos apenas o grupo virgem de tratamento, a incidência foi de 0,53%. Todos os 3 eventos foram acidentes vasculares cerebrais do tipo isquêmico.
No grupo da Varfarina, evento tromboembólico – um ataque isquêmico transitório – ocorreu em 1 paciente, resultando em taxa de 0,6%.
A título de comparação, em um dos primeiros estudos avaliando a eficácia de anticoagulação nesse cenário, em 1969, a taxa de evento tromboembólico em indivíduos que não fizeram uso de nenhum anticoagulante foi tão alto quanto 7%.
MENSAGEM FINAL:
– A dabigatrana demonstra segurança na prevenção de eventos embólicos pós CV para pacientes com FA / Flutter há mais de 48 h
– 4 semanas de anticoagulação pré e pós CV parece ser um tempo adequado para os doentes, inclusive aqueles que eram virgens de tratamento anticoagulante.
– O tempo para se realizar a CV, uma vez indicado, é bem menor em comparação a Varfarina.
– A maioria dos pacientes (90%) utilizou dose de 150 mg 2xd. Portanto, não se sabe se podemos extrapolar esses resultados para pacientes com doses menores.
– O maior uso e novos estudos clínicos tenderão a consolidar ainda mais esse resultado, sobretudo com maior N de pacientes.
Leitura sugerida:
A.-K. Johansson e cols. Is one month treatment with dabigatran before cardioversion of atrial fibrillation sufficient to prevent thromboembolism? Europace Advance Access published May 27, 2015. Disponível aqui