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Forame oval patente: intervir sempre?

O forame oval patente (FOP) não é considerado uma mal formação congênita por definição e tomar condutas em relação a ela ainda é motivo de muita polêmica. Porém, nos últimos anos alguns estudos surgiram para tentar preencher essa lacuna de evidências. Com isso, a sociedade europeia publicou um posicionamento sobre o manejo dessa patologia e a equipe do temas em cardiologia resumiu para você em forma de um bate papo interessante sobre as principais dúvidas relacionadas ao tema:

1. Qual a definição de Forame oval patente?

O forame oval é um defeito embrionário no septo interatrial que permite a passagem do sangue oxigenado do átrio direito para o átrio esquerdo. Essa abertura se fecha espontaneamente no período neonatal à medida que a resistência pulmonar cai e uma quantidade maior de sangue começa a fluir pelos pulmões com um aumento subsequente da pressão do lado esquerdo. A sua persistência é denominada como Forame oval patente e, em ecocardiogramas de rotina, sua prevalência é de cerca de 25% na população.

2. O FOP está realmente associado com AVC criptogênico?

Existe na literatura algumas evidências associando FOP e Acidente vascular cerebral (AVC) criptogênico baseado em dados epidemiológicos, estudos observacionais clínicos e por estudos clínicos randomizados mostrando que o fechamento do FOP reduz a recorrência de AVC em comparação com a terapia médica. No entanto, a evidência tem sido controversa devido ao papel diferente que um FOP pode desempenhar em diferentes cenários clínicos e à falta de estudos prospectivos adequadamente dimensionados.

3. Qual a definição de embolia criptogênica?

A embolia criptogênica da circulação esquerda isquêmica é definida como qualquer isquemia (sintomática ou assintomática) ocorrendo em um leito arterial que não tem uma causa conhecida, apesar de investigação extensa. Após procura da causa, se for encontrado apenas um FOP, o paciente deve ser classificado como tendo embolia relacionada ao FOP ao invés de embolia criptogênica.

4. Quais os fatores aumentam o risco de embolia relacionado ao FOP?

Pacientes com idade menor que 55 anos, que não possuam comorbidades ou fatores de risco para AVC, que têm história atual ou pregressa de Tromboembolismo pulmonar, portadores de apneia do sono e aqueles com história de atividade física no momento do AVC possuem maior probabilidade de terem embolia relacionada ao FOP. As características do FOP que aumentam a probabilidade dessa patologia estar relacionada com a embolia sistêmica são um aneurisma do septo atrial, shunt moderado a grave, FOP de grande tamanho, hipermobilidade septal atrial, presença de valvula de Eustaquio ou rede de chiari. Nem a localização nem o tipo de padrão do AVC na substância cinzenta ou branca foi específico para embolia relacionada ao FOP em estudos observacionais. Os infartos corticais são geralmente considerados embólicos, mas uma meta análise recente sugere que infartos não corticais também possam ter origem embólica.

5. Quais os fatores de risco de recorrência de embolia relacionado ao FOP?

As variáveis ​​associadas a uma maior taxa de recorrência em pacientes com FOP são: aneurisma do septo atrial e/ou grande diâmetro do FOP, pacientes idosos, distúrbios de coagulação, AVC como evento índice, D-dímero > 1.000 na admissão e ausência de uso de ácido acetilsalicílico ou anticoagulante oral.

6. Como diagnosticar um FOP? Existe algum padrão ouro?

O diagnóstico de FOP é necessário apenas para decidir sobre um tratamento e não há padrão ouro para seu diagnóstico. Uma combinação de ecocardiograma transtorácico (ETT), ecocardiograma transesofágico (ETE) e doppler transcraniano (DTC) pode ser necessária. Os autores definem o seguinte algoritmo para detecção de FOP: Se o ETT ou o DTC for positivo, busque um ETE para confirmação. Se o ETT for negativo ou duvidoso, busque o DTC e, se o DTC for negativo, interrompa a investigação.

7. Qual a melhor forma de tratamento medicamentoso? AAS ou Anticoagulação oral?

O tratamento medicamentoso é eficaz em reduzir a recorrência de AVC, porém não há dados definitivos para orientar a escolha entre um antiagregante plaquetário ou um anticoagulante oral (ACO) para a prevenção secundária de AVC relacionado ao FOP. Embora o ACO possa ser superior aos antiagregantes plaquetários na prevenção de AVC relacionado ao FOP, o ACO também aumenta o risco de hemorragia intracraniana. O ACO pode ser preferido se o paciente tiver um risco hemorrágico baixo, se uma boa adesão for esperada e se for garantida uma adequada monitorização do anticoagulante.

8. Há evidências sobre o uso dos novos anticoagulantes orais nesses casos?

Não. Até o momento não existe ensaio clínico randomizado controlado de prevenção secundária em AVC relacionado ao FOP com uso dos anticoagulantes orais diretos (DOACs). Assim, não é possível fazer nenhuma recomendação sobre o uso desses medicamentos. 

9. Quando indicar o fechamento percutâneo do FOP?

É necessário avaliar alguns aspectos antes da indicação de fechamento do FOP. Primeiro, avaliar a probabilidade de que o FOP tenha um papel relevante no quadro clínico observado(AVC criptogênico, AIT ou embolia sistêmica). Segundo, deve-se avaliar probabilidade de que o evento clínico observado se repita. O escore de risco de embolia paradoxal (RoPE score) pode ser útil para ajudar a orientar as decisões, mas estudos de validação ainda são necessários. Para pacientes com a maior probabilidade de ambos, o fechamento do FOP deve ser aconselhado. Para pacientes com a menor probabilidade, a terapia médica deve ser considerada. Para pacientes com probabilidades intermediárias, o julgamento clínico é necessário para permitir uma boa tomada de decisão em relação ao paciente.

10. Há indicação de realização de profilaxia para Endocardite antes de procedimentos invasivos após a realização do fechamento percutâneo?

A profilaxia antibiótica contra endocardite antes de um procedimento invasivo deve ser realizada em todos os pacientes nos primeiros 6 meses após o fechamento.

11. Existe indicação de anti agregação após o fechamento percuntâneo?

Existe indicação de terapia antiplaquetária dupla por 1 a 6 meses após o fechamento do FOP. O consenso sugere que uma monoterapia antiplaquetária seja continuada por pelo menos 5 anos. A extensão da terapia com antiagregante plaquetário única para além dos 5 anos pode ser realizada baseada no balanço entre o risco de AVC do paciente e o risco hemorrágico. A escolha da droga antiplaquetária no seguimento é atualmente empírica.

Leitura sugerida

Pristipino C, Sievert H, D’Ascenzo F, et al; Evidence Synthesis Team ; Eapci Scientific Documents and Initiatives Committee ; International Experts . European position paper on the management of patients with patent foramen ovale. General approach and left circulation thromboembolism. Eur Heart J. 2018 Oct 25.

Sobre o Autor

Caio Cafezeiro

Médico com residência médica em Clínica Médica Hospital Santo Antônio (OSID-BA) e em Cardiologia Clínica pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor-HC-FMUSP).

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